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Capítulo 21 - 1807


Bonaparte se esgueirava sorrateiramente pelos becos de Lisboa, cobrindo o rosto e caminhando sozinho para não chamar a atenção para si e ser reconhecido.


Havia recebido uma informação importantíssima sobre seu, até então, amigo Dom João e havia decidido que aquilo não poderia acontecer assim, de forma tão fácil.


- Aquele covarde imbecil – murmurava ele -, como pode achar que sou tão tolo desse jeito.


A garoa fina já cobria todo seu corpo de modo a transmitir um incomodo frio, mas estava perto, muito perto, por isso não se incomodou tanto. Um objetivo tão nobre não pode ser privado de algumas intemperes.


Saiu enfim dos becos de Lisboa e percorreu a estrada longa, até a bifurcação a direita. Uma estrada de terra o recebia e o acolhia com árvores gigantescas lhe acompanhando naquela noite escura e fria.


Quando chegou, a porta já estava aberta, por isso foi entrando.


- Olá mestre – Antera lhe disse -, quanto tempo. Imagino que já tenha ficado sabendo dos planos de Dom João.


- Sim – disse, irritado. – Aquele desgraçado acha mesmo que isso vai acontecer assim, de forma tão fácil?


- Eu lhe avisei que não seria tão simples assim trazê-lo para o seu lado, deveríamos ter acabado com ele há muito tempo.


- Não, não, você não pode pensar de forma tão pequena Antera, meus planos são mais ambiciosos.


- E o que pensa em fazer mestre Bonaparte?


- Onde estão seus modos? – Bonaparte rebateu. – Não vai me oferecer uma água ou um chá? O que houve com a hospitalidade portuguesa?


- Desculpe, senhor. É que estou empolgada com o que irá acontecer...


- Escute – Bonaparte falou. – Ouço passos.


- Aquira, é você? – Antera falou.


- Oi mamãe, quem está aí? – Disse ela, com uma voz sonolenta.


- Volte para a cama filha, é só um amigo da mamãe.


- Está bem – ela respondeu e os passos foram se afastando aos poucos.


- Então – disse Antera -, onde estávamos?


- Antera, você tem a solução ideal para o que pretendo fazer – Bonaparte falou, olhando na direção por onde a pequena criança dava seus passos.


Antera sentiu um leve arrepio na nuca, amava demais Aquira para permitir que alguma coisa acontecesse com ela.


- E o que está pretendendo Bonaparte?


- Não vamos destruir Dom João – disse ele de forma sombria -, vamos destruir o futuro dele. A herança dele. A terra que ele pôr os pés, pois não há maior morte do que a de uma história.


Antera suspirou e uma gota de suor lhe escorreu da testa. Sabia o que Bonaparte pretendia fazer e sabia a glória que ele alcançaria depois daquilo, mas usar a própria filha para aquilo não lhe agradava.


Bonaparte percebeu a expressão de desgosto em sua fase, por isso falou:


- Antera, você sabe muito bem que se ela não for para o Brasil carregando nossa semente, que levamos tanto tempo para criar, ela morrerá aqui, pois vou invadir esse lugar e destruir tudo depois que Dom João partir. Todos vão morrer pelas minhas mãos. - Antera ficou surpresa diante da ameaça. - Portanto, no Brasil ela vai poder ter uma vida, uma família, filhos e, quando tiver filhos e depois netos, nosso plano começará a se tornar real e vamos contemplar tudo isso aqui, nessa sala, nós dois. Imagine como isso será bom.


- Mas...mas não posso ficar longe da minha filha, ela é tão pequena, não vai saber o que fazer quando chegar lá.


- Não seja tola Antera, se sua filha tiver um décimo de sua sabedoria e inteligência, com certeza ela vai saber o que fazer quando chegar lá. E eu vou estar por perto também. Vou ajuda-la. Afinal de contas, para o plano dar certo, a filha dela precisa ser minha filha também e, quando acontecer o parto, essa filha também precisará ser sacrificada para dar à luz a nova raça.


- E essa raça, vai fazer o que exatamente?


- Essa raça vai conquistar o mundo para nós – Bonaparte se aproximou de Antera e lhe tocou os ombros enxergando um brilho em seus olhos. – Tudo será nosso Antera, todas as províncias, todos os estados, todos os países e continentes, os mares, as ilhas, os céus, tudo nosso, e controlaremos uma nação inteira poderosa, toda ao nosso favor.


Bonaparte se aproximou ainda mais de Antera, levou a mão direita ao seu rosto enquanto falava e aos poucos ela foi se entregando para aquele senhor poderoso.


- Vamos viver – continuou ele -, depois disso, para sempre, sem concorrência. Só eu – puxou o rosto dela para o seu -, e você – e então lhe beijou, um beijo doce que selava um futuro amargo para a humanidade.


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