Capítulo 12 - Mago
- T.S.Duque
- 21 de set. de 2015
- 4 min de leitura

- Deixem eles irem – Irineu falou. – Deixem que espalhem a notícia do terror.
- Tem certeza, senhor? – Mago perguntou, e os outros esqueléticos ficaram parados, esperando uma ordem.
- Sim, quanto mais pessoas souberem, mais rápido virão atrás de nós e mais servos teremos.
Mago concordou, mas o fato de saber que Juninho também estava naquele carro o incomodava. Será que ele teria poder para nos parar de alguma forma? Pensou, não com tanta convicção, no entanto.
- Vamos para o próximo cemitério – disse Irineu -, mais alguns recrutas e começamos a destruição. Qual é o próximo Mago?
- Vila Formosa mestre, é o maior da américa latina. Depois dele já podemos começar com nossos objetivos.
- Ótimo, ótimo. Vamos até lá.
O Cemitério da Vila Formosa, inaugurado em 1949, ocupa uma área de 763.175 m² e já foram realizados quase dois milhões de sepultamentos por lá, números mais do que excelentes para os planos de Irineu. É claro que não haveriam tantos soldados enterrados por lá naquela noite, mas seu tamanho era sinônimo de grandes quantidades de corpos.
Sem dúvida era um plano ousado, mas a partir dali as coisas mudariam significativamente. Seria possível organizar a manada para mais recrutamentos e ainda começar o tão desejado objetivo de destruir tudo pela frente.
A distância para o cemitério era relativamente longa, então Mago, o único que não possuía poderes para se locomover tão rápido quanto os demais, resolveu pegar um carro. Havia diversos estacionados na rua, se aproximou do mais próximo, quebrou o vidro e logo estavam todos a caminho da Vila Formosa.
A noite ainda duraria algumas horas, mas logo alguém daria falta daqueles garotos, ou aqueles homens fariam algum tipo de denúncia e Mago sentia que uma guerra estava para começar a qualquer momento e ele sabia que estava do lado certo. Do lado vencedor.
Ao chegarem na Avenida João XXIII deram de cara com o portão principal. A faixada branca se elevava do chão com dizeres que não agradavam ninguém além de Irineu. Acima da faixada haviam três cruzes douradas, uma ao lado da outra, uma grande no meio e duas menores aninhadas paralelamente.
O portão simples de ferro pintado de verde não era um grande quesito de segurança. Afinal de contas, ninguém se preocuparia em aplicar um nível de segurança elevada em um cemitério. Portanto o carro não parou quando chegou. Mago pisou no acelerador e o portão foi completamente destruído. Continuou guiando o carro pelas ruas internas do cemitério, passando por lápides de todos os gostos e tipos. O lugar parecia mais um parque do que um cemitério, com muitas árvores bem conservadas, flores, plantas, jardins, mas um enorme mausoléu logo a frente tirou sua atenção e então sua consciência o levou de volta ao lugar em que estava, não era um parque, era um poderoso cemitério.
Parou o carro e todos desceram. Mago pegou o pó da virgem de sua bolsa e começou o ritual tudo outra vez. Chão tremendo. Céu negro como a morte trovejando. Vento forte rodeando seu encantamento. Chão rachando em todas as direções. E corpos voltando a vida para servir ao seu senhor supremo.
Mago notou, quando todos começaram a se levantar e caminhar em sua direção, se aninhando perfeitamente como no primeiro cemitério, que alguns ainda não estavam em total estado de decomposição. Alguns resquícios de pelo, e até mesmo órgãos, estavam presentes em alguns corpos, o que tornou a visão ainda mais fúnebre.
Irineu pareceu se incomodar com o fato e foi logo até o primeiro da fila que ainda possuía quase todos os fios na cabeça, uma parte dos lábios e glóbulos oculares bem brancos, como se ainda estivesse vivo.
- O que houve com você – ele perguntou. O morto pareceu confuso, balançando a cabeça como se não soubesse falar ou se não entendesse aquele que falava. – Responda recruta. O que houve com você? Você nem parece que está morto. Não posso admitir isso.
- Eu – o morto abriu a boca como se estivesse aprendendo aquela arte de se comunicar bem ali, naquele momento -, fui morto a poucos dias, eu acho.
- E como foi que aconteceu? – Irineu perguntou e todos ao redor estavam prestando atenção na conversa, intrigados.
- Bem, me lembro vagamente, parece que aconteceu em outra vida. – Ele respondeu, começando a levar aquilo de forma mais natural. – Acho que foi um assalto, isso mesmo, foi um assalto, e o bandido não teve piedade, mesmo entregando-lhe tudo o que eu tinha.
O morto levou involuntariamente a mão direita até o coração. Havia um buraco de bala ali. Provavelmente o motivo da morte. E Mago poderia jurar que viu uma lagrima despencando de seus olhos.
- E você – Irineu perguntou -, tem piedade?
- Não sei dizer senhor – ele respondeu.
- VOCÊ TEM PIEDADE? – Irineu gritou, como se não quisesse uma resposta que não fosse NÃO.
- Não tenho – disse ele, tentando demonstrar confiança.
- Então destrua esses seus resquícios de carne, soldado. Não aceito uma raça manchada no nosso meio – Irineu voltou a gritar -, E TODOS OS QUE ESTÃO COMO ELE, FAÇAM O MESMO, AGORA MESMO – Irineu foi até o mausoléu, o maior que havia ali, subiu em cima dele e gritou – FAÇAM ISSO E VAMOS EM BUSCA DE SUAS VIGANÇAS. VOCÊS QUEREM VINGANÇA?
- Sim – todos gritaram, como se a arte de falar fosse tão comum quanto voltar dos mortos.
E imediatamente todos os que estavam como aquele morto começaram a arrancar a própria pele. Mago contemplou coros cabeludos sendo lançados pelo alto. Corações. Glóbulos oculares. Tudo o que poderia remetê-los a uma vida diferente da que seu mestre exigia estava sendo arrancada de si. Seriam uma raça pura. Completamente branca. Branca da cor dos ossos.
- VAMOS LÁ – Irineu gritou novamente – VAMOS DESTRUIR TUDO.
E mago viu um exército de esqueléticos correndo em direção as ruas para realizar a devastação.
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